7/02/2007

...telhado...

-Por favor, desce daí!
-Calma... o que que você acha que eu vou fazer?
-eu não acho nada. Tô com medo de achar qualquer coisa
.
-Pronto. Desci.
[abraço]
-Quer saber de um segredo bobo?
-hum
-Quando eu era criança eu morava em uma casa com quintal grande, a casa também não era exatamente pequena, mas eu não conseguia ficar sozinha, não por muito tempo. o meu quarto não era meu, era "nosso", sempre tinha gente aonde eu me refugiasse, se não tinha, chegava logo. Eu acho até que eu já tinha desistido de achar um cantinho pra mim. Mas um dia quando fui pegar minha bicicleta pra sair pra brincar, reparei em uma escada de madeira, que estava sempre ali, mas eu nunca tinha nem motivos pra dar atenção a ela. Meu pai usava essa escada as vezes....pra podar a parreira de uvas ou pra limpar a caixa d'água. Por um milagre, não tinha ninguém olhando... Subi.
-No telhado? Sozinha? quantos anos você tinha?
-Não lembro...mas quando eu cheguei lá no telhado ouvi minhas irmãs brincando na varanda, e de onde eu estava, elas não podiam me ver. Aquilo era tudo o que eu queria... um lugar onde eu era invisível... achei uma sombra, do pé de goiaba - e eu nem tinha ideia de que ele era tão alto - e me sentei, sem perceber comecei a chorar...por tudo e por nada... fiquei lá até achar que o vermelho do meu rosto ja tinha sumido um pouco - branquelas quando choram não conseguem ser muito discretas - e desci.
[silencio]
- Ninguém deu por minha falta, sentei na cozinha, perto da minha mãe, que fazia um trabalho manual e ela nem tinha notado que eu sumi por horas, nem tinha notado que eu tinha chorado... Minhas irmãs estavam na sala. uma disse: iih que cara é essa? descobriu que Papai Noel não existe...rs...cara de decepção...eu hein?! meu olho encheu d'água e eu quis poder voltar pro telhado instantaneamente. a outra disse: Que foi Nem? quê que houve? - Nada. - respondi.
[segura a lágrima]
- Fui pro quarto, misteriosamente vazio, deitei, dormi quase imediatamente... Subir lá, se tornou um hábito... Que durou até meus 17 anos... quando tive que me mudar de lá, numa época em que tudo estava virando de cabeça pra baixo - e até hoje não voltou à posição normal - eu senti que nunca mais ia encontrar um "telhado" ... faz 5 anos já ... eu estava certa, nunca mais encontrei. Aprendi a chorar baixinho, antes de dormir, a casa hoje é menor, mais vazia, o quarto já é "meu", mas nunca mais achei meu telhado... nunca mais tive o sossego de chorar despreocupada... salvo raras exceções, que não posso transformar em hábito, não pude prolongar o hábito...
[...]
-desculpa te incomodar com esse segredo bobo.
-Eu gostei do segredo... Achei que você nunca quisesse ficar sozinha, tá sempre com alguém por perto...
-Eu tenho medo de ficar "sozinha em público" e chorar, por isso a companhia
-Era isso que você estava fazendo aqui em cima? procurando encontrar um "telhado"?
-Não.
[cara de ?]
-eu tava tentando alcançar ou talvez enxergar alguma coisa que perdi, não me lembro nem quando nem onde, nem sei ao certo se realmente tive.
-Tá, olha só...agora eu nao entendi nada ¬¬ . Tem certeza que você tá entendendo o que ta falando??
-Não. e certeza é a única coisa que eu tenho a certeza de ter perdido. ... Contraditório ne?!
-Bastante.
[...]
-Como você me encontrou aqui?
-Acho que de alguma forma... nossos cerebros, e sentimentos estão na mesma frequência...







..........................................................................................................................don't ask. It didn't happened. I can't understand my own thougths too...

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